Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 1595/19, que busca regulamentar as ações contraterroristas; agorinha (16/09), uma Comissão Especial da Câmara dos Deputados aprovou parecer e remeteu ao plenário o tal projeto, de autoria do deputado Major Vitor Hugo (PSL-GO), o que foi alvo de severas críticas da oposição e de alguns setores da imprensa. Mas por que?
Por definição trazida pela Lei
Antiterrorismo ( Lei nº 13.260, de 2016), o terrorismo é
definido como sendo a prática por um ou mais indivíduos dos atos previstos
neste artigo, por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito
de raça, cor, etnia e religião, quando cometidos com a finalidade de
provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a
paz pública ou a incolumidade pública; xenofobia, do grego (xénos:
estranho; phóbos: medo), é sentimento de hostilidade e ódio manifestado contra
pessoas por elas serem estrangeiras.
Por mandamento constitucional,
e por conta de tratados internacionais de que o Brasil é signatário, adotamos
como princípio orientador de suas relações internacionais o repúdio ao
terrorismo, considerado pela própria Constituição da República um crime
inafiançável e insuscetível de graça ou anistia (graça e anistia são formas de
perdão; o que no Direito chamamos Clementia Principis).
Até aí nada de mal se verifica
em se apresentar o Projeto de Lei 1595/19, buscando regulamentar as ações
contraterroristas e assim regrar as ações do Estado contra essa prática odiosa
e, nessa linha segue o projeto do ex-líder do governo na Câmara (Deputado
Federal Major Vitor Hugo, do PSL de Goiás), o que é destacado pelo Relator do
projeto, o Deputado Federal Ubiratan Antunes Sanderson – policial federal de
carreira e também do PSL, mas pelo estado do Rio Grande do Sul – que explica: Especial
relevo o Autor empresta à substancial diferença entre este Projeto de Lei e a
Lei nº 13.260 de 2016. Enquanto esta tipifica o crime de terrorismo, o Projeto
de Lei, por sua vez, prevê uma série de ações e ferramentas concretas de
prevenção e combate ao terrorismo.
O ponto de discórdia e de
preocupação – justificada ou não – é que já em seu primeiro artigo surge um
dispositivo estabelecendo que Esta Lei será aplicada também para prevenir e
reprimir a execução de atos preparatórios previstos no art. 5º da Lei nº
13.260, de 16 de março de 2016, e para atos que, embora não tipificados como
crime de terrorismo sejam ofensivos para a vida humana ou efetivamente
destrutivos em relação a alguma infraestrutura crítica, serviço público
essencial ou recurso-chave. Acontece que alguns veem o projeto como forma
de punir atos potencialmente destrutivos – é o caso de Luana Patriolino,
do Correio Braziliense, em matéria publicada esta semana sob o título Comissão
Especial da Câmara aprova projeto polêmico para nova lei antiterrorismo e
chamada Matéria tipifica atos terroristas e prevê excludente de ilicitude a
agentes de segurança.
Como se vê, o projeto não fala
em punição a atos potencialmente destrutivos, mas sim em atos
efetivamente destrutivos; e mais, a matéria critica a existência de
excludentes da ilicitude que poderiam dar carta branca aos agentes
contraterroristas, ao estilo 007; na verdade, o projeto em sua redação original
trazia: Art. 13. Presume-se atuando: I – em legítima defesa de outrem
o agente público contraterrorista que realize disparo de arma de fogo para
resguardar a vida de vítima, em perigo real ou iminente, causado pela ação de
terroristas, ainda que o resultado, por erro escusável na execução, seja
diferente do desejado; II – em estrito cumprimento do dever legal ou em
legítima defesa de outrem, conforme o caso, o agente público contraterrorista
compondo equipe tática na retomada de instalações e no resgate de reféns que,
por erro escusável, produza resultado diverso do intentado na ação; e
III – em estado de necessidade ou no contexto de inexigibilidade de conduta
adversa o infiltrado que pratique condutas tipificadas como crime quando a
situação vivenciada o impuser, especialmente, se caracterizado risco para sua
própria vida.
Assim, com a devida vênia, uma
leitura atenta ao texto nessa redação original já seria suficiente para nos dar
conta de que não se trata de uma licença para matar, ao estilo James Bond, mas
um reconhecimento, em dadas circunstâncias do que já se vê previsto no Código
Penal como erro na execução da ação; agora que explicado, vem a informação
final: esse artigo não aparece mais no Substitutivo encaminhado para votação
pelo Plenário da Câmara, portanto, a discussão deve ser superada...
Entretanto, resta ainda a
incógnita trazida pelo primeiro artigo do projeto, quando estabelece que Esta
Lei será aplicada também ... para atos que, embora não tipificados como crime
de terrorismo sejam ofensivos para a vida humana ou efetivamente destrutivos
em relação a alguma infraestrutura crítica, serviço público essencial ou
recurso-chave; até aqui, como já dissemos, o crime de terrorismo tem como
foco exclusivamente aquelas ações deliberadamente orientadas por razões
de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e
religião; e agora com o Substitutivo proposto seria alargado esse
espectro para qualquer ato ofensivo à vida humana, por outras motivações que
não xenófobas e também aqueles que causem destruição de prédios públicos ou
serviços essenciais?
Vale lembrar o caso da Operação
beco sem saída, que tinha como objetivo explodir bombas em várias
unidades da Vila Militar, da Academia Militar das Agulhas Negras (...) e em
vários quartéis, e que levou o então Ministro do Exército, General Leônidas
Pires Gonçalves, a submeter um capitão a um processo expulsório chamado
Conselho de Justificação, ao final julgado pelo Superior Tribunal Militar assim
decidido:
Distrito Federal. Relator
Ministro Sérgio de Ary Pires. NO MÉRITO, julgou, POR MAIORIA, o Cap Ex JAIR
MESSIAS BOLSONARO não culpado. Os Ministros ANTÔNIO GERALDO PEIXOTO
(Presidente), JOSÉ LUIZ CLEROT, LUIZ LEAL FERREIRA e HAROLDO ERICHSEN DA
FONSECA julgaram não justificado o Cap Ex JAIR MESSIAS BOLSONARO, determinando,
em consequência, sua reforma nos termos do artigo 16, inciso II, da Lei n°
5.836, de 05 de dezembro de 1972.
O terrorismo de ontem é bem
diferente do terrorismo de hoje...