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Azor Lopes da Silva Júnior

Advogado, professor universitário e jornalista


LEVANTA-TE LÁZARO: PARA REPENSARMOS AS SAÍDAS TEMPORÁRIAS

Por: Azor Lopes da Silva Júnior
21/06/2021 às 17:48
Azor Lopes da Silva Júnior

Hoje (21/06) completamos 13 dias de buscas por Lázaro Barbosa de Sousa; o triste espetáculo seria mais uma das tantas histórias de criminosos habituais e suas fugas, não fosse a repercussão, em nível nacional, que a mídia deu ao caso e isso se deve, em grande parte, pelas ações cinematográficas adotadas pelas forças de segurança que operam em Goiás e no Distrito Federal, numa verdadeira caçada ao criminoso. 

No último dia 18, quando procurado pela afiliada de Rede Globo do Distrito Federal para falar sobre o caso – e isto na condição de presidente do Instituto Brasileiro de Segurança Pública (IBSP, sediado em nossa São José do Rio Preto) – a primeira resposta que dei (em OFF) ao jornalista da redação, com quem era ajustada a gravação da entrevista, e que me perguntava se eu estava inteirado sobre o Caso Lázaro, foi a de que estávamos diante de um Remake da trilogia Rambo. A entrevista foi gravada e exibida nos dias 18 e 19 na Globo DF (Fonte: Globo.com © 2000-2021 Globo Comunicação e Participações S.A.; DF2 Jornalismo. Disponível em: https://globoplay.globo.com/v/9617261).

Nessa mesma linha seguiu a análise de também outro nosso Associado do IBSP, José Vicente da Silva Filho, ex-Secretário Nacional de Segurança Pública (2002), falou ao Correio Brasiliense sobre o que chamou de espetacularização do caso (Confira: https://www.correiobraziliense.com.br/cidades-df/2021/06/4932067-cinco-perguntas-para-jose-vicente-da-silva-filho.html).

Vamos entender o caso; Lázaro Barbosa (33), no momento é investigado e procurado pelo assassinato de 4 pessoas da mesma família (pai, mãe e 2 filhos adultos), ocorrido no dia 09 de junho de 2021 em Ceilândia (DF). Mas o "Caso Lázaro” me provoca – e eu gostaria de abrir uma outra reflexão mais estrutural – sobre uma questão pontual de nossos sistemas judiciário e penitenciário do país.

A trajetória criminosa de Lázaro começa aos seus  19 anos de idade, com um homicídio na Bahia no ano de 2007, seguido por série de roubos e um estupro em Brasília em 2009, que o levaram ao Complexo Penitenciário da Papuda, no Distrito Federal, até que, em 2016, ele foi dado como foragido, por não retornar de uma saída temporária; em 2018, Lázaro foi recapturado e novamente preso em Águas Lindas de Goiás, mas logo em seguida fugiu (23/07/2018), até que, poucos dias após (31/07), foi avistado, perseguido, por policiais militares do Grupo de Patrulhamento Tático e fugido numa motocicleta, não sem antes trocar tiros com a polícia.

Procurado desde então, em 2020, mais uma vez Lázaro é apontado como suspeito do assassinato, a golpes de machado, de um idoso no estado de Goiás, sem, contudo, ser preso.

É só agora, com o episódio do brutal assassinato de toda uma família (Cláudio Vidal, de 48 anos, Cleonice Marques, de 43 anos, e seus dois filhos, Gustavo Marques Vidal, de 21, e Carlos Eduardo Marques Vidal, de 15) que nosso Lázaro chamou a atenção de todo o país, não faltando os que indevidamente o apontam como como Serial Killer e, ainda, os que suscitam a hipótese descabida de que ele seja um psicopata, coisa superada, porque se o fosse isso já lhe teria beneficiado nos processos anteriores e ele teria sido declarado inimputável e submetido à internação (medida de segurança).

Lázaro é, na verdade, um de tantos outros violentos criminosos habituais, que obtém benesses legais que, sem critério ou sem a necessária análise dos sistemas judicial e penitenciário, são concedidas durante a execução da pena, como é o caso – especialmente – das saídas temporárias.

Vejamos como a Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984) regula a Saída Temporária, popularmente conhecida por "Saidinha” e, às vezes, indevidamente confundida com o Indulto.

Vamos começar descartando o emprego incorreto do termo indulto (de Natal, Dia das Mães etc.); o Indulto é uma causa de extinção da punibilidade, pela qual se beneficia um ou mais condenados, que estejam cumprindo pena após devidamente condenados – ou mesmo antes de iniciarem seu cumprimento – concedida por ato exclusivo do Presidente da República por meio de um Decreto, tal como previsto no inciso XII do artigo 84 da Constituição Federal: Compete privativamente ao Presidente da República: ... conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos em lei; historicamente esses decretos ocorrem às vésperas do Natal, tal e qual a tradição Romana, que levou a libertação de Barrabás.

O indulto, portanto, apaga a pena (totalmente ou a parte remanescente da pena a cumprir; nesse caso é chamado de comutação da pena) e pode ser individual (quando é chamado de graça) ou coletivo (que mais comumente ocorre).

Já a saída temporária – forma pela qual Lázaro saiu da prisão – não é mecanismo de perdão do condenado, mas sim uma política criminal, estabelecida pela Lei de Execução Penal (1984), a partir de regras previstas no seu artigo 122 e seguintes, dirigida exclusivamente aos que cumprem pena no regime semiaberto e com três finalidades específicas: visita à família e frequência a curso (supletivo profissionalizante, 2º grau ou superior) ou, finalmente, para a participação em atividades que concorram para o retorno ao convívio social.

A lei estabelece que essas saídas temporárias não ultrapassarão 7 dias e que poderão ser renovadas por até 4 vezes durante o ano, mas desde que o preso tenha comportamento carcerário adequado, haja cumprido no mínimo um sexto da pena (se for primário, porque se for reincidente será exigido um quarto) e, por fim, que haja compatibilidade do benefício com os objetivos da pena.

Vale destaque nesta nossa abordagem, que somente a partir do Pacote Anticrime de 2019 é que se proibiu o benefício da saída temporária àqueles que cumprem pena por crimes hediondos com resultado morte, outrora também beneficiados...

Talvez Lázaro tenha se levantado para nos mostrar, por sua história de vida e obra, que é pela porta da frente, nessas corriqueiras saídas temporárias, que uma legião de criminosos condenados, ao longo de todos os anos, venham sendo despejados – sem qualquer vigilância policial – no meio da sociedade, e que talvez seja hora de repensar essa medida de política criminal...






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