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Azor Lopes da Silva Júnior

Advogado, professor universitário e jornalista


TRÊS PESSOAS SÃO CAPAZES DE GUARDAR UM SEGREDO (SE DUAS DELAS ESTIVEREM MORTAS)

Por: Azor Lopes da Silva Júnior
08/06/2021 às 14:54
Azor Lopes da Silva Júnior

Nos últimos dias, enquanto a Procuradoria-Geral da República pede o arquivamento do famoso "Inquérito dos Atos Antidemocráticos” (Inquérito 4.828), em relação a vários investigados, o Ministro Alexandre de Moraes do Supremo Tribunal Federal (STF) suspende o absoluto sigilo que havia decretado ao caso; noutro caso de conteúdo conexo, o "Inquérito das Fake News” (Inquérito 4781), o sigilo é mantido.

O que se procurava apurar, no "Inquérito dos Atos Antidemocráticos”, seriam condutas criminosas previstas nos artigos 16, 17 e 23 da Lei 7.170/83, da "Famigerada Lei de Segurança Nacional”. Essa lei, que agora é usada pelo próprio atual STF, apesar de defenestrada porque teria surgido durante o "Regime Militar” – mas que, na verdade veio já na fase da chamada "Abertura Política” (1983) – traz em seu artigo 16, a punição, com pena de reclusão de 1 a 5 anos, daquele que integre ou mantenha associação, partido, comitê, entidade de classe ou grupamento, que tenha por objetivo a mudança do regime vigente ou do Estado de Direito, por meios violentos ou com o emprego de grave ameaça; já no seu artigo 17, a pena é de 3 a 15 anos àquele que tente mudar, com emprego de violência ou grave ameaça, a ordem, o regime vigente ou o Estado de Direito; por fim, é punido, na forma do artigo 23, com pena de 1 a 4 anos os que incitem outros à subversão da ordem política ou social, à animosidade entre as Forças Armadas ou entre estas e as classes sociais ou as instituições civis e à luta com violência entre as classes sociais.

Em momentos de tamanho extremismo ideológico – e para que não se diga que este artigo penda para um dos lados dessa odiosa polarização que hoje sofremos – é de bom tom deixar claro que o "Inquérito dos Atos Antidemocráticos” foi instaurado em 21 de abril de 2020 a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), que agora no início de junho de 2021, por seu vice-Procurador-Geral, Humberto Jacques de Medeiros, pede o arquivamento, daí porque nos parece leviano sustentar manipulação da PGR em favor do Governo Federal e seus apoiadores.

Contextualizados os fatos, o que chamo à atenção é para o fato de que Alexandre de Moraes tenha "quebrado o sigilo” de um desses inquéritos, somente após o relatório da Polícia Federal ter "vazado” para a reportagem do Fantástico; sim, é no próprio portal G1 que se vê publicado no dia 06 de junho de 2021: "Relatório da PF sobre os atos antidemocráticos mostra que aliados de Bolsonaro atacaram o STF após um julgamento sobre a pandemia. Fantástico teve acesso à análise feita pela Polícia Federal de mensagens no celular do empresário bolsonarista Otávio Fakhoury, que mostra uma conversa em 22 de maio do ano passado com a deputada Bia Kicis, do PSL”; as perguntas que ficam são: (1) em uma democracia seria possível inquéritos ou processos sigilosos? E mais: (2) se a mais alta Corte do país decreta sigilo de um inquérito, qual a consequência para quem viola esse sigilo?

Do próprio Ministro Alexandre de Moraes vem a resposta para a primeira pergunta, quando, nos autos do "Inquérito dos Atos Antidemocráticos”, ele determina o "levantamento do sigilo” (noutras palavras, suspende o sigilo até então por ele decretado); diz ele:

"Nos termos do inciso IX do art. 93 da Constituição Federal de 1988, todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação.”.

 

Já quanto à segunda pergunta ("vazaram; e daí?”), fica a dúvida e até mesmo a inquietação, porque, além de ser suspenso o sigilo, somente após o vazamento do relatório "sigiloso”, não se vê notícia de tenha sido tomada qualquer medida judicial voltada contra a violação daquilo que estava sob sigilo... Vale dizer, eu determinei o sigilo, mas já que descumpriram minha ordem, "libera a geral”...

Para piorar esse cenário, veja-se que a reportagem do Fantástico chega a divulgar trechos de conversações privadas, o que fere a Constituição Federal e a própria Lei da Interceptação Telefônica: "A deputada enviou um áudio para o empresário transcrito no relatório da Polícia Federal no qual diz que: o Barroso chegou a citar a hidroxicloroquina. Ou seja, estão querendo impedir né o Bolsonaro de... de recomendar né. O empresário responde: Canalhas. Olha, vai ser muito difícil terminar esse governo sem entrar de cabeça numa guerra institucional contra eles, porque eles é que invadem o Executivo.”.

A Lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996, que regulamenta a quebra do sigilo das comunicações telefônicas, de dados de informática e de telemática, estabelece que é crime, punido com pena de reclusão de 2 a 4 anos, além de multa, a quebra desse sigilo...

Nem se diga que o vazamento não possa ser considerado crime, porque a Constituição resguarda o sigilo da fonte, porque, quando muito, essa lógica talvez pudesse valer em benefício do jornalista responsável pela matéria, mas jamais em favor daquele servidor policial ou do judiciário, que vazou a informação e os conteúdos das conversações telefônicas, que recebem a proteção constitucional da intimidade e privacidade, direitos fundamentais que nos protegem a todos.

Por isso, senhor Ministro, vale lembrar o que Benjamin Franklin  teria dito: "Three can keep a secret, if two of them are dead” (Três pessoas são capazes de guardar um segredo, se duas delas estiverem mortas).






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