Há poucos dias o Fórum Brasileiro de Segurança Pública divulgou seu ANUÁRIO BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA 2021, revelando um crescimento das mortes violentas intencionais..
Foram 50.033 vítimas em 2020
contra 47.742 no ano anterior, o que corresponde a uma taxa nacional de 23,6
mortes violentas por grupo de 100 mil habitantes, contra 22,7 no ano de 2019.
Foram então 2.291 assassinatos a mais em 2020 em todo o país.
As maiores taxas foram registradas
nos Estados do Ceará (45,2/100 mil), Bahia
(44,9/100 mil), Sergipe (42,6/100 mil), Amapá (41,7/100 mil) e Paraíba (38,3/100 mil), enquanto as menores ficaram
com os Estados de São Paulo (9,0/100
mil), Santa Catarina (11,2/100 mil), Minas
Gerais (12,6/100 mil), Distrito
Federal (14,2/100 mil) e Mato Grosso do
Sul (17,5/100 mil).
Se isso já não espantasse, outro
estranho espanto causado pelo relatório é que em 2020 foram 11.916 casos de
assassinatos em que não se esclareceu quem fora o criminoso, número inferior ao
verificado em 2019 (13.611 crimes de morte não esclarecidos); se somarmos a
isso o número de 142.451 crimes violentos não letais contra o patrimônio (roubo
e furto de veículos) e ainda outros 994.369 onde, raramente se tem a prisão em
flagrante do criminoso, a conclusão é de que teremos algo em torno de 1
milhão, 148 mil, 736 crimes não esclarecidos... Esse é o maior problema de
um sistema policial e judicial que precisa ser mudado.
Mas o que causa esse problema?
Ineficiência da polícia? Ineficiência do sistema judiciário? Ineficiência do
Ministério Público? E qual a consequência dessa causa: impunidade!
A polícia investigativa
(polícias civis estaduais e federal) não é ineficiente por opção ou falta de
preparo; ela sofre com uma demanda gigantesca de rotinas puramente burocráticas
e cartoriais, como no registro de boletins de ocorrência e na elaboração de um
inquérito policial que – dizem os juristas – é peça meramente informativa e
dispensável, mas que é praticamente a única via de entrada no sistema
judiciário; falar de investigações do Ministério Público é algo pífio dentro
desse universo de números de crimes, porque suas investigações são puramente
seletivas e, no mais das vezes, para se dizer o coloquial, Judiciário e
Ministério Público comem na mão das polícias...
Então seria o Ministério
Público o culpado pela ineficiência escancarada nesses números estratosféricos?
Certamente que não, porque, mesmo agindo seletivamente na investigação de
certos crimes, o papel de apuração dos delitos é da polícia; ao Ministério
Público cabe, por força constitucional – e caberia mais, se a sociedade desse
olhos e lhe cobrasse a devida atenção a esse problema de macropolítica criminal
– o chamado controle externo da atividade policial, que certamente não
se resume à auditorias formais em delegacias e quarteis...
Seria então o Poder Judiciário
o culpado ou cumplice? Em princípio não, mesmo porque seu papel exige isenção
para o julgamento final do acusado; porém, ele não é um mero e inocente
expectador dos processos, mas lhe cabe estar sempre atento aos sucessivos pedidos
de prorrogação do prazo para a conclusão das investigações policiais, nem
sempre bem justificados e quase nunca fiscalizados pelos Promotores de Justiça
e pelos Juízes Criminais...
Mas nem tudo está perdido.
Em 1995 surgiu uma quase
desconhecida pela sociedade civil: a Lei dos Juizados Especiais Criminais que,
como se fosse uma experiência no laboratório desse sistema, viu que a
burocratização dos inquéritos policiais levava a dois graves problemas: (1) ao excesso
de trabalho sobre os ombros das polícias investigativas, impedindo seus
esforços na elucidação de crimes graves e; (2) à prescrição dos delitos menos
graves, que, no jargão popular, caducavam quando davam entrada no Poder
Judiciário.
Mais um problema foi
enfrentado e testada nova estratégia de solução ou mitigação: as polícias
militares, cuja principal função social é estarem patrulhando as ruas, buscando
evitar a ocorrência de novos crimes, ficavam horas a fio paradas nos plantões
policiais para o registro das ocorrências em que intervieram, deixando as ruas
sem sua presença tão desejável para a prevenção.
Daí porque essa Lei dos
Juizados Especiais Criminais permitiu que os pequenos delitos (brigas,
ameaças, agressões com lesões leves, acidentes de trânsito com vítimas, porte
de drogas etc.) pudessem ser registradas de uma forma mais simplificada e
encaminhada diretamente ao Poder Judiciário, sem onerar a polícia investigativa
e sem levar as patrulhas a perderem horas nas delegacias: surgia o Termo
Circunstanciado de Ocorrência.
Nossa São José do Rio Preto e
as outras 37 cidades do entorno, de 01 de dezembro de 2001 até 09 de setembro
de 2009, foram laboratório dessa nova estratégia que somente foi interrompida
por questões puramente políticas e nada técnica, a despeito do apoio do Poder
Judiciário e Ministério Público e dos quase 100 mil usuários desse serviço
naqueles anos; mas esse é um assunto que não deve ser relembrado e nem
enfrentado pelos gestores das polícias aqui no Estado de São Paulo... Não me
perguntem o porquê...
O fato é que, de lá para cá,
estivemos capacitando gestores e agentes policiais em todos os Estados do
Brasil e discutindo em arenas como o Ministério da Justiça, a Secretaria
Nacional de Segurança Pública, Comissões da Câmara dos Deputados e do Senado da
República e, finalmente, nas etapas municipal, estadual e nacional da 1ª
Conferência Nacional de Segurança Pública, que se desenrolou ao longo de 2009,
finalizada em Brasília, amadurecendo a estratégia e reforçando as experiências.
Agora, o Instituto
Brasileiro de Segurança Pública (ibsp.org.br) – uma entidade sediada em
nossa querida São José do Rio Preto – que congrega mestres e doutores do campo
científico-acadêmico de todo o país realizou ao longo deste mês de julho a 1ª
Conferência Nacional sobre o Termo Circunstanciado de Ocorrência, trazendo exposições
dos Estados de Minas Gerais e São Paulo (01/07), Rio Grande do Norte e Mato
Grosso (08/07), Piauí, Ceará e Paraná (15/07), Rio Grande do Sul, Bahia e Goiás
(22/07) e, finalizando nesta quinta-feira (29/07), a partir das 19h, com
Roraima e Santa Catarina. Maiores informações estão disponíveis no link https://ibsp.org.br/conferencia-nacional-termo-circunstanciado-de-ocorrencia/ e,
ainda, todos os conteúdos das exposições da conferência estão disponíveis à
sociedade, autoridades públicas, pesquisadores e comunidades acadêmicas no
YouTube: https://www.youtube.com/channel/UC8JotliXpTVPI_VfQr8QtNA
Atribuem a Albert Einstein a
frase Insanidade é continuar fazendo sempre a mesma coisa e esperar
resultados diferentes; não sejamos nós os insanos... De nossa parte fica o
ufanismo: sou rio-pretense e não desisto nunca.