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"Dona Ivone Lara, a Rainha do Samba e Grande Dama do Samba"
Foto por: Divulgação
"Dona Ivone Lara, a Rainha do Samba e Grande Dama do Samba"

‘Sonho meu, sonho meu’

Por: Maria Elenice Vicentini
22/11/2023 às 15:02
Artigos

‘Sonho meu, sonho meu, Vai buscar quem mora longe, sonho meu! Vai buscar essa saudade, sonho meu, E a sua liberdade, sonho meu!’


O ano era 1978... vivíamos a época da ditadura. Nos chegavam notícias de pessoas presas, torturadas, desaparecidas, além de  exilados  políticos. Foi um período sombrio, onde suportamos a travessia dessa página infeliz da nossa história com a poesia , a potência de uma voz melodiosa que surgia nos embalando e inspirando a sonhar, acreditar em liberdade e igualdade. A voz de uma mulher negra, neta de escravos, Yvonne Lara da Costa (1922-2018) marcava os momentos da nossa história.

Após se aposentar aos 56 anos de idade, ela teve destaque no mundo do samba como compositora, tocando cavaquinho, cantando e encantando com sua dança. Foi consagrada  "Dona Ivone Lara, a Rainha do Samba e Grande Dama do Samba".

À frente de seu tempo, junto com sua família, frequentava as rodas de samba em ambiente quase exclusivamente masculino. Não podia se mostrar compositora pelo simples fato de ser mulher. Em 1965, inovou o universo machista do samba, sendo a primeira mulher a assinar um samba enredo oficial e a fazer parte da ala de compositores da escola Império Serrano.

O que poucos sabem é que ela foi também enfermeira, assistente social e terapeuta ocupacional. Trabalhou junto com a psiquiatra Nise da Silveira, ambas precursoras do movimento antimanicomial. Concursada pelo Ministério da Saúde foi trabalhar no Centro Psiquiátrico Nacional, em Engenho de Dentro/RJ, onde eram internadas pessoas com problemas mentais e comuns os tratamentos agressivos com eletrochoque e lobotomia. Nessa época as pessoas eram institucionalizadas nos manicômios e era comum serem abandonadas pela família. Dona Ivone se deslocava para os municípios do RJ e estados vizinhos, localizando parentes dos internos para apresentar uma visão de inclusão, buscando a desinstitucionalização; distintamente da maioria dos diagnósticos médicos, que desacreditavam a condição mental dessas pessoas.

Sua atuação, por anos invisibilizada, foi fundamental para se pensar o cuidado interdisciplinar em saúde mental. Aproveitou seus conhecimentos como instrumentista, compositora e participante das atividades musicais junto com familiares e amigos, aplicou-as em seu trabalho.

Em 1946, sugeriu a criação de uma sala de música, e foi assim que surgiu o Serviço de Terapia Ocupacional, onde implantou a Musicoterapia, cuja técnica promove a comunicação, criação e melhora do quadro clínico, levando a uma diminuição no uso de medicamentos e tempo de internação.

Tudo isso, quase 20 anos antes de Foucault escrever ”A história da Loucura” e da organização do movimento antimanicomial. Quase 60 anos antes da promulgação da Lei 10.216, que redirecionou o modelo de Saúde Mental no Brasil. Essa nova visão, humanizada do cuidado de saúde mental, norteou a Reforma Psiquiatra Brasileira, e a organização do cuidado da Rede de Atenção Psicossocial do SUS, principalmente na atuação dos serviços dos CAPS – Centro de Atenção Psicossocial.

Seu legado e trajetória de vida nos ilumina! Só nos resta reverência e gratidão!

"Abençoada pela luz da poesia

Eu vou cantando para espantar a dor”

 

Maria Elenice Vicentini, enfermeira sanitarista em defesa do SUS - Sistema Único de Saúde, membra do Coletivo Mulheres na Política.







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