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Artigo - Mulheres Negras que Inspiram
Foto por: Rugendas & Grafite de rua
Artigo - Mulheres Negras que Inspiram

Durvalinas, Cidas e Marias

Por: Merli Diniz
16/11/2023 às 15:51
Artigos

Não tenho fotos de nenhuma delas, pois à época em que as conheci, jamais sonhávamos que a tecnologia pudesse nos proporcionar o telefone celular e outras facilidades que o mundo digital nos contempla, mas, em nome da Durvalina, Maria e Cida, homenageio as mulheres negras, as desconhecidas, as não famosas, de igual importância, fontes de inspiração para mim


Começo falando da Durvalina, cujo apelido era Dorva. Trabalhava para minha família e como não poderia deixar de ser, doméstica, consequências do processo histórico cultural do país, com o regime escravocrata que persistiu, apesar de que, há mais de um século a Lei Áurea tenha abolido a escravidão no Brasil, do ponto de vista legal, pois na prática, temos reflexos até hoje da enorme desigualdade no que diz respeito ao tratamento dado aos negros.

Voltemos à Dorval. Negra, mas tão negra, da cor do pássaro preto que cantava todas as manhãs para ela, quando chegava a minha casa. A imagem que tenho gravada em minha retina, era seu olhar cabisbaixo, a lavar a louça na pia da cozinha. Sempre a respeitamos, pois não tínhamos ranços preconceituosos. Gostávamos dela e ela de nós.

Já a Cida, era tão esperta, tão esperta, que quando não queria ir trabalhar, criava um monte de artifícios inimagináveis que faziam minha mãe rir demais. Como ela morava longe e tinha um problema de saúde, se não aparecesse causava preocupação. Aí mamãe ia até a sua casa para ver se havia algo errado. Quando percebia o carro chegando, se escondia debaixo da cama ou atrás da porta para que não a encontrassem. Entretanto, esses seus ardis hilários fazia a alegria de todos. Certa ocasião, minha mãe que morava sozinha, passara mal com vômitos e diarreias e ela prontamente, alertou aos familiares para que a levassem para o hospital, pois os dedos dela estavam ficando roxo e que ela iria morrer. Quanta sabedoria numa pessoa tão simples. Mamãe foi diagnosticada com pancreatite e foi salva da morte iminente, graças a essa abençoada criatura.

Maria também nos causou fortes emoções com informações e atitude as mais engraçadas possíveis. Certo dia, anunciou com pompa e circunstância que sabia fazer caviar. A meninada achou graça e claro, quisemos saber como era e ela na sua simplicidade e desconhecimento, sapecou:

-  Faço com sardinha, salsinha, maionese e de quebra, berinjela.

Foi demais!

Outro aspecto interessante da nossa convivência, era que ela tinha um namorado que morava em outra cidade e quando o dito cujo aportava na nossa, ela não queria nem saber, largava tudo e ia se encontrar com ele.

Tempos de harmoniosa convivência, respeito e consideração nossos e delas. Saudade!

 

Merli Diniz

Professora, advogada, escritora, poeta e cronista, Diretora do Sindicato dos Escritores de SP e membro da Comissão de Direito e Literatura da 22 ª Subseção da OAB/SP

 

 







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