Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil é o país da América Latina com o maior número de pessoas com o transtorno. São mais de 12 milhões de brasileiros com depressão – no mundo são mais de 264 milhões de pessoas com a doença
"É possível ficar tudo bem, eu
juro! Eu queria muito que essa dor terminasse, mas ela passa. Então, é muito
possível ficar bem!”. A empresária e baterista Yasmin Tranjan, de 30 anos, não
contém as lágrimas ao deixar uma mensagem aos que enfrentam a depressão a
pedido da reportagem do DLNews que, enquanto escrevia esse texto,
cantarolava a música "Coisas da Vida”, da rainha do rock brasileiro Rita Lee.
Yasmin foi diagnosticada com
depressão há três anos. Os primeiros sintomas foram contrários aos que todos
estão habituados a escutar sobre o transtorno mental. Diferentemente de uma
tristeza profunda e falta de energia e ânimo para realizar qualquer atividade,
ela foi acometida pelo stress e pela irritabilidade intensa.
"Eu estava extremamente irritada.
Caía alguma coisa no chão e eu já queria matar todo mundo. Eu estava muito
impaciente e ansiosa, trabalhava muito e sempre queria me sentir muito ocupada.
Por isso eu demorei tanto para entender que isso era um sintoma muito grave da
minha depressão, que por sinal estava em estágios bem avançados”, conta.
A baterista também não sentia
mais forças para fazer as atividades comuns do dia. De repente, todas as
atitudes que a levaram a ser quem ela é na vida perderam o sentido e seu mundo
ficou apático, cinza.
"Eu comecei a perceber que eu não
conseguia entender a razão de acordar, fazer, trabalhar, casar e ser uma pessoa
normal. Eu acreditava muito que a morte era, sem dúvida, a melhor saída.
Porque doía muito, eu não me encontrava, eu não me sentia eu. Todas as decisões
que eu tomara eram baseadas em alguma coisa que não era eu. Eu simplesmente não
sentia nada, nem coisa boa ou ruim, eu vivia apática”, explica.
A baterista conta que teve muita
dificuldade em compartilhar seus sentimentos com os amigos. Para ela, o
preconceito estava presente nas falas de pessoas de sua convivência. "A
depressão ainda é vista como um estado da pessoa e não como uma doença química
no corpo dela. Eu tinha uma resistência por conta do preconceito que eu também
tinha – algumas pessoas me diziam que era falta de filho, falta de Deus. Então,
eu contei somente para as pessoas muito próximas, que eram as minhas melhores
amigas da minha banda, meu marido e minha família”, diz.
Após ser incentivada pelos
familiares a procurar ajuda profissional e iniciar um tratamento com terapia,
medicação, alimentação alcalina e yoga, Yasmin também encontrou na música um
momento de encontro verdadeiro consigo.
"No início eu estava impossível
de me comunicar, fiquei muito tempo sem conseguir trabalhar na minha empresa e
a única coisa que eu conseguia fazer era tocar. Eu não sei explicar como isso
aconteceu dentro de mim, mas a música me ajudou muito nesse processo. Quando eu
tocava eu estava comigo de verdade”, revela.
"Dê Pressão"
Assim como para a Yasmin, a
música também foi para o jovem Lucas Oliveira, de 26 anos, grande aliada no
tratamento da depressão e na externalização da dor. Entre os anos de 2015 e
2017, o músico passou por diversos conflitos, chegando ao auge do transtorno.
O fim de um relacionamento
amoroso, a sobrecarga de inúmeras responsabilidades com os estudos e o
trabalho, comportamentos hostis, além do falecimento da "tia Célia” (vizinha
que ele apadrinhou de segunda mãe), tornaram-se uma grande bola de neve que
foram consumindo sua vida. Ainda se negando a olhar de frente para a situação,
Lucas se viu diante de grandes excessos.
"Eu não sabia que tinha depressão
e não aceitava isso. Então comecei a fugir, foram muitas fugas. Eu agendava
shows com a banda direto, a vida noturna foi me consumindo, foram muitos os
excessos e eu fui perceber que eu precisava de ajuda quando eu cheguei a ponto
de me ferir”, relembra o jovem quando atentou contra a própria vida.
Após chegar ao estopim da crise,
Lucas não conseguia mais fingir que estava tudo bem e procurou ajuda.
"Eu tentei conversar com pessoas
mais velhas da minha família, mas existe um problema cultural de as pessoas
acharem que a depressão é falta de serviço, falta de trabalho, falta de Deus, e
muitos não me davam atenção porque não entendiam a gravidade do problema. Isso
me fez entender que o tratamento era importante e a medicação me ajudou a
organizar as ideias”, conta.
Para externalizar o que sentia, Lucas
compôs a música "Dê Pressão” (veja o clipe abaixo), que gravou com a
participação da locutora Lolla Scafe, também vocalista da banda The Monnas (na
qual Yasmin é integrante). No clipe, que já soma 18,4 mil visualizações no
Youtube, Lucas revela sua história - o cara feliz, cheio de amigos, que bebia
todas e postava fotos com frases de efeito nas redes sociais, mas que por
dentro enfrentava uma tempestade de sentimentos e precisava de ajuda.
"Na época nem eu sabia o que eu
sentia, mas eu também não sentia liberdade para falar sobre isso. Também é
importante partir de cada um a vontade de se curar e dar o primeiro passo. A
gente pode escutar o outro, mas não tem receita mágica, a gente também tem que
tomar cuidado para não tomar o lugar de nenhum profissional, a gente tem que
preservar a gente e preservar o outro, tá ligado? Eu já cheguei a ter medo de
mim mesmo, mas hoje eu me sinto bem e renovado”, revela o músico que atualmente
não faz uso de medicação nem bebidas alcoólicas.
Setembro Amarelo
Segundo a Organização Mundial da
Saúde (OMS), o Brasil é o país da América Latina com o maior número de pessoas
com o transtorno. São mais de 12 milhões de brasileiros com depressão – no
mundo são mais de 264 milhões de pessoas com a doença.
Organizada desde 2014 pela
Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) em parceria com o Conselho Federal
de Medicina (CFM), a campanha Setembro Amarelo tem como objetivo prevenir o
suicídio. Dados disponíveis no site oficial da campanha mostram que
cerca de 12 mil suicídios são registrados por ano no Brasil e mais de 1 milhão
no mundo. Destes números, cerca de 96,8% dos casos de suicídio estavam
relacionados a transtornos mentais.
A psicóloga Aline Carceres
explica que falar sobre a saúde mental tornou-se importante nos últimos tempos.
"Está havendo uma valorização da
saúde mental e emocional. Então, falar de depressão é muito importante porque a
depressão não é fraqueza ou falta de Deus, por exemplo. A depressão é uma
doença que atinge milhões de pessoas no mundo e afeta o humor, o pensamento, a
disposição e o comportamento da pessoa. Existem tratamentos eficazes e
conhecidos para a doença, mas muitos dados mostram que há uma defasagem mundial
no tratamento porque ainda há um estigma social e também o preconceito. A depressão
pode ser prevenida e tratada, mas é preciso termos uma visão aberta sobre a
doença, entender que a doença é real e existe”, esclarece a especialista.
Como perceber que o seu amigo
não está legal
- A pessoa apresenta mudanças no
comportamento como falta de entusiasmo, falta de energia e motivação;
- Afastamento ou isolamento das
atividades sociais;
- Confusão e dificuldade de tomar
decisões;
- Baixo rendimento no trabalho;
- Problemas alimentares;
- Distúrbio do sono;
- Baixa autoestima;
- Sensação de culpa;
- Pensamentos negativos e de
desvalorização consigo;
- Perda de prazer pela vida;
- Abuso de álcool e drogas;
- Ansiedades e medos;
- Irritabilidade, inquietude e
pessimismo;
De que forma eu posso ajudar?
"Justamente por ser uma pessoa que
a gente conhece e ama, é natural a gente querer estar presente na vida dessa
pessoa. É importante mostrar que você e outras pessoas se preocupam e estão
disponíveis a dar apoio. Ter em mente que é uma condição séria e que essa
preocupação pode significar muito. É importante saber ouvir e oferecer auxílio
de um tratamento psicológico e as vezes até psiquiátrico, ajudando essa pessoa
entender que o tratamento é fundamental”, orienta a psicóloga.
Assista ao clipe da música Dê
Pressão abaixo: