Algumas coisas são naturais na nossa espécie.
As crianças, por
exemplo, fazem interpretações literais das frases que os adultos falam para
elas. Isso significa que quando dizemos à uma criança, a metáfora "está
chovendo canivetes”, ela provavelmente irá se assustar e não fará a
interpretação, que um adulto faria, de ser um comentário a respeito de algo que
é improvável de acontecer.
Ao longo dos anos, com o estímulo de familiares, da sociedade e da
escola, as crianças deixam as interpretações literais e passam a fazer uma
interpretação mais adequada e correta dessas figuras de linguagem. Assim também
funcionam muitas coisas na nossa sociedade.
Quando tomamos contato com
determinado assunto, trabalho, comportamento, temos uma reação primitiva e
literal dos fatos e atos. Com o tempo, espera-se que os atores tenham uma visão
e um entendimento mais lógico, analítico e orgânico das coisas.
Vamos tomar, por exemplo, uma situação que tem sido corriqueira
nos últimos tempos. Não é incomum, vermos "pregadores” do empreendedorismo,
ditando regras e comportamentos como se seguindo a receita que ele indica, seus
seguidores alcançariam o paraíso, representado pela riqueza e o sucesso(seja lá
o que signifique para cada um).
O empreendedorismo tem sido tratado de forma quase messiânica, por
indivíduos que pouco ou nada construíram de concreto. Seja uma startup, uma
empresa, ou uma ideia que foi difundida e aproveitada por várias pessoas.
Posso dizer que não é assim tão simples. Até porque, se assim fosse,
não existiria miséria, pobreza e frustração. Bastaria seguir a receita e todos
estariam ricos(que é um conceito subjetivo). Precisamos tomar muito cuidado com
o que escutamos e com o que passamos a diante.
O senso crítico e analítico devem ser estimulados nas crianças
para que não sejam enganadas, no futuro, pelos mercadores da ilusão e do
resultado fácil. Temos alguns outros exemplos de variantes dos empreendedorismo
messianico que tem campeado pelo mundo: O Constitucionalista sem faculdade de
direito, os especialistas em serviço público sem experiência de governo e os
infectologistas sem curso de medicina.
Claro que mesmo uma pessoa
tendo um diploma, que lhe conferiria certa notoriedade, todas as profissões
estão sujeitas aos charlatães. Os malandros e aproveitadores, assim como a
cadela do fascismo, estão sempre no cio, e prontos para procriar, sempre
disponíveis para dar uma opinião, para lesar os mais vulneráveis, para sacar
suas credenciais de especialista e arrotar palavras como se fossem verdade
absoluta.
Enfim! A literalidade é uma análise rasa, superficial, que serve
apenas como um primeiro contato, não se prestando a tirar o melhor de algo que
recém tomamos conhecimento e que não nos é comum e cotidiano.
Existe uma fábula, atribuída a Esopo, que gosto muito e cito com
frequência em palestras que faço, se chama "A assembléia dos ratos”: Relata que
uma vez os ratos, de uma fazenda, viviam com medo de um gato, resolveram fazer
uma reunião para encontrar um jeito de acabar com aquele transtorno. Muitos
planos foram discutidos e abandonados. No fim, um rato jovem levantou-se e deu
a ideia de pendurar uma sineta no pescoço do gato; assim, sempre que o gato
chegasse perto eles ouviriam a sineta e poderiam fugir correndo. Todo mundo
bateu palmas, o problema estava resolvido. Vendo aquilo, um rato velho que
tinha ficado o tempo todo calado levantou-se do seu canto e falou que o plano
era muito inteligente, que com toda certeza as preocupações deles tinham
chegado ao fim. Só faltava uma coisa: quem iria pendurar a sineta no pescoço do
gato? Moral da história - Falar é uma coisa, fazer é outra.
Para podermos sonhar com um mundo melhor precisamos estimular as
pessoas a se aprofundarem mais nos assuntos, para que as análises rasas levem a
falsa sensação de que a resolução de problemas complexos é simples.