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Angélica Zignani

Diretora artística e de elenco da Cia dos Pés e ativista cultural


E se...

Por: Angélica Zignani
23/08/2019 às 09:58
Angélica Zignani

E se a forma de pensar a criança fosse de respeito e humanidade? Isso mudaria alguma coisa?

E se a existência fosse considerada desde as primeiras sensações na gestação? Respeitando e entendendo essa nova realidade como um elo da humanidade e não simplesmente como uma repetição do padrão comportamental de desenvolvimento social, patriarcal, que tem como arautos a religião e o mercado capital?

O feminino teria, então, o seu lugar especial de fala, visto em sua plenitude? Será que nasceriam guerreiros ou "soldados*” ao invés mamíferos humanos aptos a amar? Ou seria isso um pensamento materno utópico, longe de aplicações reais?

Hoje podemos observar nos diversos "tutoriais de como criar seu filho”, diversas referências de como gerar um "soldado”. Os soldados são formados já nos primeiros instantes, através da separação da criança de sua mãe e depois da separação dos corpos no berço e em diversas ações através do desenvolvimento infantil, entre elas, o choro e a opinião engolida ou abafada por palmadas. 

Não é preciso grandes pesquisas para encontrar as maneiras adequadas de se criar um filho.

Nas ruas é natural observar os braços puxados, e as pernas curtas forçadas a entrar no ritmo adulto, a submissão sendo obtida pelo dedo em riste, em qualquer situação ou exposição e as ordens rotineiras desde as primeiras horas da manhã até a luta incessante para que o contato familiar seja interrompido pela hora de dormir. Foi possível perceber através destas palavras a existência de escravos infantis, guiados pelos adultos soldados, aptos a enfrentar o mundo? Ou a sua farda, abarrotada de medalhas de bravura não permite espaço para vislumbrar uma existência de candura?

Desabotoando um pouco a farda, sentindo a respiração existente novamente, faço uma afirmação que talvez possa ser recebida como um ataque: o mundo não é ruim. Eu entendo, faço esse exercício quase diariamente, o de mudar aquilo a que fui condicionada. Aconteceu e acontece que somos levados a acreditar nas instruções passadas por nossas avós e repetimos como a única maneira de viver a vida.

E se pudéssemos acolher, olhar e conversar com a criança, considerando que aquele ser pequeno não é um ser menor? Será que soldados seriam necessários, se quando definíssemos a criança, focássemos na novidade dela e não no tempo que perdemos com ela, no dinheiro que se gasta investindo nela, no tormento que é sair para atividades sociais com ela, nos olhinhos virados omitindo informações reais, nas bravuras dos castigos naturais que se oferece?

Será que deixaríamos nossa vingança de lado?

Afinal de contas, agora estamos no lado do comando, podemos enfim exercer a dominação que nos foi feita enquanto seres menores, somo agora os GRANDES.

*"Se todo ser humano quando nasce precisa e, portanto, espera entrar em contato com a mesma qualidade de conforto que experimentou durante os nove meses no útero de sua mãe, o fato de não encontrar calor, suavidade, ritmo cardíaco reconhecível, braços que o amparem, palavras que o acalmem, nem corpo que o proteja, nem leite que o alimente, mas ao contrário, deparar-se com um inóspito berço vazio e sem movimento, simplesmente torna essa experiência (a de nascer) aterrorizante e hostil.”
"Todas as crias de mamíferos humano nascem com a sua capacidade de amar intacta e, obviamente, esperando ser amparadas, nutridas e cuidadas, já que o início da vida é a única maneira de viver o amor.” (desenho original da espécie humana, segundo Laura Gutman)

E se quando nascesse uma criança, nascesse a possibilidade de uma nova maneira de enxergar o mundo. E se estamos deixando escapar essa imensa possibilidade de evolução?

E se essas perguntas pudessem fazer ações em cada um que as leu?
(*as citações entre aspas são de Laura Gutman em seu livro Biografia Humana)






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