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Dom Tomé Ferreira da Silva

Bispo diocesano de Rio Preto


Tempo pandêmico: mais dúvidas que certezas

Por: Dom Tomé Ferreira da Silva
28/04/2020 às 11:56
Dom Tomé Ferreira da Silva

Há uns sessenta dias, um pouco mais ou um pouco menos, a pandemia, então só uma epidemia, não é mais realidade e assunto só da China, mas do mundo, e também do Brasil. 

Com isso, a nossa vida pessoal sofreu uma reviravolta, com profundos reflexos na organização da sociedade, sobre a natureza e que marcará a história. À medida que os fatos acontecem, ocorre uma desenfreada busca de explicações e soluções, necessárias para a sobrevivência, para o convívio humano, para a saúde da terra e os fins da história. No entanto, temos mais dúvidas e perguntas, do que certezas e respostas.

A dilaceração provocada pelos fatos, que fere o corpo, a psique e o espírito, e a limitação das respostas científicas, que retardam medidas técnicas, nos levam a criar uma nebulosa realidade, onde somos, ao mesmo tempo, sujeitos e objetos, e vivemos "tateando no escuro”, caminhando quase "a esmo”, no ritmo do acerto e do erro, pois sem clareza no horizonte, não há objetividade na ação. 

Não há culpados, ao menos por enquanto, mas podemos ser cúmplices, por não fazermos bem o que podemos e, por isso mesmo, devemos fazer, cada qual no seu "quadrado”, se bem que a crise nos mostra que os quadrados são interligados e interdependentes.

Não sei se poderia ou deveria ser diferente, mas algumas decisões, neste tempo pandêmico, tomadas nos escritórios, com diálogo seletivo, são sugestivas, ao decidirem sobre e para outros, sem o devido conhecimento de quem são e como vivem estes "outros”. A reclusão imposta, restringindo o convívio social, por exemplo, veio mostrar alguns "invisíveis”, os que se encontram em situação de rua, os que vivem em barracos, em casas precárias, ou em residências demasiado pequenas. Será que isto fortalecerá o desenvolvimento de uma política habitacional diferente e mais adequada? 

De uma hora para outra, a sociedade ficou surpresa, ao constatar forçadamente, que um número significativo de pessoas não possui condições normais de higienização, necessária para evitar a contaminação com a covid 19, pois falta água, banheiro, pia, chuveiro, bacia e sabão. E que o álcool em gel, para muitos, é um luxo, inacessível. E se a fome já era existente, ou a alimentação era inadequada, está sendo a sociedade civil a garantir "o pão de cada dia”, ou a amenizar a dor de não ter o que comer, para muitos que deveriam ser assistidos de modo permanente pelo Estado, enquanto se encontram em situação de vulnerabilidade social. Depois da pandemia, haverá uma política de "renda mínima”, mais abrangente, que atinja a todos os que precisam?  

Outro dado interessante é a definição de "atividades essenciais”, como princípio para determinar o que pode e o que não deve "funcionar” nas cidades. Em sociedades profundamente desiguais, não é fácil, e muito pouco provável, encontrar "uma média” razoável para determinar o que seja, ou não, essencial para os cidadãos. Alguns setores significativos da sociedade não são sequer ouvidos, ou comunicados adequadamente, através das suas organizações representativas, das decisões tomadas e a serem observadas. Em outras palavras, não há um trato das pessoas como cidadãs, mas são abordadas como massa a ser conduzida, silenciosamente, com as ameaças da fiscalização e ou punição, onipresentes para uns, e quase ou inexistentes para outros.  

"Queira Deus eu esteja enganado”, mas passaremos por um bom tempo sujeitos a trovoadas, rajadas de vento e tempestades, mas nos encontramos no mesmo barco, embora alguns em posição singular. O timoneiro não pode agir sozinho, nem só ouvir "a hierarquia do comando”.  Quem escuta mais, tem chances de errar menos, pois nem só de "ciência”, qual ciência (?), vive a humanidade. Diante do risco de tantas "imposições”, não é mal pensar nas "liberdades individuais”, se não comprometem a vida dos outros.  






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