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Jill Castilho

Arquiteto e escritor


O Luto

Por: Jill Castilho
23/01/2020 às 08:26
Jill Castilho

Aquele momento em que recebemos a notícia da morte de um ente amado, aquela ligação no meio da madrugada ou a notícia dada por um médico, que diz ter feito o possível. Nestes instantes, a respiração se altera, o coração bate mais forte, uma dor imensa invade o ser. Como lidar com esta dor e seguir a vida sem aquela pessoa ao nosso lado?!

Há dezenove anos, meu irmão mais velho falecia num acidente de carro, morte súbita. Meus pais receberam uma ligação por volta das cinco da manhã, indo direto para o hospital, deixando em casa, eu e minha irmã. Sem notícias, ligo para minha avó materna, que aos prantos, grita ao telefone: "O Joelzinho morreu, Jill....”, cai a ligação. Ligo novamente, não acreditando, ouço a mesma frase por mais três vezes, assim interrompo a ligação com um choro involuntário, parecendo não caber em meus olhos. Ao meu lado minha irmã mais nova que mesmo não ouvindo a notícia, entende o ocorrido. Juntos, abraçados, aos prantos, esperamos a dor sessar, mas até hoje não acabou.

A quase um ano e meio, no corredor da Unidade Básica de Saúde de minha cidade, sentado em cadeiras desconfortáveis, ao lado dos meus pais, aguardávamos notícias da minha irmã, que havia dado entrada na emergência. Do corredor víamos a porta da sala de emergência, a qual não parava de entrar e sair enfermeiros. Em um momento, em prece peço a Deus pra ficar tudo bem. Então, o médico sai da sala e nos informa do falecimento dela por conta de uma parada cardíaca.

Dois momentos decisivos na minha vida e da minha família. No primeiro, estava com dezessete anos, sem experiência de Luto, foi um choque. Já no segundo, bem recente, mais maduro, ainda em processo de compreensão. Em ambos, sinto como se uma bomba houvesse explodido em nossa casa, estraçalhando tudo e todos, porém não conseguindo ver os estilhaços ou as partes do resto da ruína. Então, como procurar os cacos para se reconstruir, se não conseguimos enxerga-los?! Como localiza-los, saber onde caíram, qual estado de cada parte e principalmente se encaixará algum dia em algum lugar dentro de cada um de nós?! 

O Tempo parece parar diante da morte, uma imobilidade invade nossos sentidos, não se consegue fazer nada sem pensar naquela pessoa. Como se a todo momento estivéssemos num eterno replay e ainda em slow motion, vivendo os últimos momentos com o ente querido vivo, ou revivendo o instante da notícia. Depois de uma perda, nada mais em nossas vidas parece fazer sentido, é como se víssemos o mundo no modo sépia, com cores opacas e amareladas. Podemos sorrir, ir a festas, trabalhar, brincar com nossos filhos, podemos até parecer felizes, mas estamos ainda procurando nossos cacos. 

O Luto é tão terrível que não nos possibilita esta consciência imediatamente após a morte, nos corrói, nos deprime até olharmos para a dor verdadeiramente, sem fingimento ou desculpas. O luto é traiçoeiro, permeia nossa rotina, trazendo medos, paranoias. Por um bom tempo me perseguiu a ideia de que meu marido morreria a qualquer hora, ou notícias ruins poderiam chegar a qualquer momento. 

Depois de tomar a consciência de todas as sequelas do luto, sigo enfrentando todos os medos e angústias. Por isso a melhor maneira de lidar com qualquer problema na vida, é olha-lo direto, sem o véu das pseudos crenças. Olhar pra dor e aceitar a sua existência, aceitar que nada que possamos fazer diminuirá, enxergá-la como um novo aprendizado. Porque a partida de uma pessoa amada não se cicatriza, nem é esquecida. O aprendizado está em aprender a conviver com a ausência e a saudade.

No processo de criação deste texto mais dois falecimentos acometeram minha família, meu gato Clint e minha amada sogra Zulmira.

Mas como dizem por aí, a Dor é inevitável, mas o sofrimento é escolha, seguindo a vida e vivendo o presente.






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