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Alaor Ignácio

Jornalista, publicitário e escritor.


Musil, Rio Preto e o Brasil

Por: Alaor Ignácio
04/01/2020 às 12:03
Alaor Ignácio

Eta contradição, definitivamente provisória! Descuido que faz e que quer cuidar da história! 

Ao invés de uma arma feita de dedos apontada para os outros, para o país, para o nada, como simboliza o bélico presidente Bolsonaro, poderíamos estar vivendo um período de luzes e de paz.

Uma mudança de gesto que mudaria uma postura, que mudaria a história. 

Mas toda essa "flexibilidade moral” (e paralela indiferença à vida) parece denotar que, brasileiros, queremos "ver no que vai dar”, assim, na sutil passividade da indiferença, repleta de argumentos torpes e vazios de sentidos objetivos: "PT nunca mais”, "Venezuela não”, "fora (sic!) comunismo”, essas coisas.

O austríaco Robert Musil (1880-1942) lá atrás, no fantástico "O homem sem qualidades” (1930-1942) – livro para uma vida inteira – jurava que "nunca se precisa ter medo de homens enfurecidos!”. E completava: "nunca houve uma oposição que não tivesse deixado de fazer oposição ao assumir o poder”. Um tanto óbvio, outro tanto temeroso, porque o homem que está aí, da ultradireita, propõe ininterrupta e reiteradamente uma prenunciação de confronto.

Há nessa obra literária um general estúpido (chamado Stumm) ansioso por colocar "ordem” no mundo, que ávido por se tornar merecedor de aceitação presencial nas rodas intelectuais e artísticas vai a uma biblioteca, para se "tornar sábio” e acompanhar as conversas. Mas, lá encontra três milhões de volumes! Espanta-se, porque evidentemente não conseguirá ler aquilo tudo. Pior, não conseguirá sequer encontrar o caminho para ler algo que possa dar-lhe um rumo para a "ordenação” dos assuntos que precisa discutir nas rodas cultas ou enxergar para o bom convívio humano. 

Enquanto anda pelos corredores da biblioteca, em companhia do bibliotecário, o general pergunta a ele como faz para conhecer o acervo, e a resposta do bibliotecário é emblemática: "tenho que gostar de todos os livros, então não posso ler nenhum para não tomar partido”.

Vivemos dias nos quais temos que medir as palavras, para que não sejam inseridas de maneira vã em contextos de confronto. Temos que manter uma postura artificialmente desinibida, com efeitos ridículos e desajeitados, para ouvir as conversas de uma maioria (78,26% da população de nossa cidade votou em Bolsonaro no 2º turno; e penso que ao menos 50% desses já se arrependeram) que pressupõe que "nada mais presta”. 

"O botão que se aperta é sempre branco e bonito”, capaz de detonar uma sinistra consciência limpa de missão cumprida (do tipo "a culpa não é minha, eu votei no Bolsonaro”) frente às falanges do mal.

Nesse no ano de 2020, quero crer que o ódio e o sectarismo percam seu combustível na proporção idêntica à clareza com que o estímulo à ignorância e ao equívoco nos setores primordiais da vida social e política da Nação se revelam oriundos de um falso messias. 

Minha fé e esperança é a de que Rio Preto não viverá mais o êxtase de, outra vez, ser uma vanguardista, sempre que os ventos políticos sopram para o avesso da democracia. Saia desse sono, em que imagens da fantasia perseguem-se umas às outras. Tal como a história já muito bem provou ao apontar o erro que a cidade cometeu um dia, imediatamente após o 31 de março de 1964.






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